Saturday, November 10, 2007

"Eu não sou um cabide!"

Decidi criar um novo cavalo de batalha para o meu blog: a imposição pelo mundo da moda do estereótipo da magreza extrema e como isso potencia a anorexia.
Assim dito mais parece título de tese de mestrado, mas chegámos a um ponto em que não há forma fácil de o dizer porque o problema é complexo e existe, embora tantos o neguem. Oponho-me a esta realidade pelo horror que esta doença pode ser, como transforma para sempre as pessoas que a sofrem, pelo facto de poder ser mortal e porque a Moda enquanto indústria tal como é agora, é sem dúvida responsável pela difusão da anorexia. Com isto não quero dizer que a moda é culpada por todos os casos de anorexia existentes, mas é impossível não julgá-la como parte do problema. Entendo Moda e Anorexia como duas esferas completamente diferentes, mas que se encontraram no momento em que esta indústria começou a tomar o conceito da " magreza extrema" como lema da derradeira beleza, levando-o ao fanatismo.

Nas passerelles, nas lojas, nas roupas e na publicidade é a mensagem da magreza extrema que é passada a todos como a imagem a ter. Embora estilistas, bookers e modelos neguem, a anorexia existe dentro do mundo da moda e a sua grande montra são as passerelles, onde modelos com corpos cadavéricos desfilam, revelando formas ou a falta delas absolutamente impraticáveis para pessoas saudáveis. Não culpo as modelos, mas a indústria da Moda mais tarde ou mais cedo tem de assumir o mea culpa pela pressão que lhes impõe de serem mais magras, para estas poderem desfilar e trabalhar no meio. Esta pressão aplicada a raparigas entre os 14 e 23 anos facilmente surte efeito e, isso vê-se claramente nas semanas de moda das capitais de moda europeias, já para não referir os casos de mortes de modelos decorrentes de anorexia. É impossível, como tantos alegam, todas aquelas modelos serem "naturally skinny", quando já se encontram muito longe do considerado "natural".
Por isso, são de louvar exemplos como os da Passerelle Cibelles em Madrid, que só começou a admitir modelos com índices de massa corporal (IMC) superiores a 18, que é o valor indicado pela Organização Mundial de Saúde como limite mínimo para uma pessoa ser considerada saudável. Esta medida reconheceu o problema e demonstrou-o na prática quando se vê um desfile ocorrido em Madrid e logo de seguida um desfile numa outra grande capital da moda, as modelos na passerelle espanhola não só parecem mais bonitas, como a roupa também ganha mais beleza, assim como a moda como indústria consegue recuperar aquele glamour da década passada. E a verdade é que as modelos são magras na mesma.
Sobre este assunto a reportagem Bones of Contention revela duas perspectivas surpreendentes de modelos, uma revela que ao ter sido recusada para desfilar na semana da moda espanhola teve que ganhar massa muscular e peso para voltar a trabalhar em Espanha e outra modelo espanhola declara que se recusa a ganhar peso e a cumprir o limite de 18 IMC não só porque receia não arranjar mais desfiles, mas também segundo as suas palavras:
-" They have to understand that is our job and the reason we're skinny is because we are hangers, you know, like our shoulders are hangers. It's very beautiful like one show with beautiful models with beautiful cloth, you know, but it's work it's not like actual life."

Se isto não revela que algo vai mal pelo mundo da moda então não sei o que será preciso.
Mas mais que afectar as modelos, a indústria da moda inevitavelmente influencia-nos a todos com esta filosofia. Os estilistas e marcas começaram a disponibilizar números cada vez mais pequenos nas lojas, bem como a forma de cada número é cada vez mais estreita. Não creio que a erradicação do "tamanho zero" seja a solução para este problema, mas a disponibilização de números maiores nas lojas pode ser. Não acho saudável que lojas sobretudo de marcas espanholas, viradas para um segmento jovem não tenham disponível o tamanho XL. Quem é que ao fim de uma sessão de compras não sentiu que podia estar mais magra uns quilos? Podemos afirmar que esta realidade não pode gerar disfunções alimentares e não influencia os comportamentos alimentares quando estamos inseridos numa sociedade que vive sob a égide da imagem?
As tendências actuais lançadas pela indústria da moda, influenciam-nos a todos com a ideia de que não há problema nenhum com a magreza extrema e que esta é desejável. E por alguma razão pouco lógica aceitamos valorizar uma imagem extremamente magra a uma imagem saudável, o que está a atingir dimensões inesperadas.

Porque considero a indústria da moda responsável, porque esta indústria merece voltar a ser cheia de glamour e a "tendência a seguir", porque a anorexia é uma doença destruidora das maneiras mais imprevistas e atrozes, porque devemos procurar sermos mais saudáveis e não só mais magros, este blog a partir de hoje vai divulgar e chamar a atenção para, e só, as boas iniciativas que visam eliminar dos media e da moda a magreza extrema. Acções e escolhas, mais simples ou de maior envergadura, que colocam a tónica noutros tipo de beleza e que retiram o monopólio do belo ao que é extremamente magro. Eu não sou um cabide que porta roupa, sou um corpo que veste roupa, para quem a imagem é importante, mas não é determinante. A verdadeira beleza não é um espectro no qual assentam umas roupas porque uma indústria acredita nisso, a beleza reside na especificidade de cada corpo e não no que lhe é imposto externamente.
Assim, este manifesto é pela saúde, pela moda enquanto "boa tendência", pela virtude da beleza e não pela sua desconstrução, contra a anorexia, por todos os que não se sentem na obrigação de estarem magros, mas sim saudáveis, por todos os que não se sentem confortáveis com a ideia de serem cabides andantes e pelo belo enquanto conceito não monopolizado pelo físico.

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