Durante toda a campanha do referendo para a interrupção voluntária da gravidez ouvi muitas vezes como argumento do Não o facto do planeamento familiar ser gratuito, universal e disponível em todo o território, para todas as camadas das sociedades e por este motivo não ser necessária a despenalização da interrupção voluntária da gravidez, porque a gravidez podia ser planeada e evitada. Todas as vezes que isto foi dito as pessoas pelo Sim alertavam que infelizmente não era essa a realidade, o planeamento familiar estava ainda longe de estar disponível para todos, sobretudo para os jovens.
Afinal sempre tínhamos razão! Como demonstra o estudo da DECO, das 85 visitas, que jovens fizeram a centros de saúde à procura de planeamento familiar, em mais de metade não passaram nem da recepção. Neste estudo chegam-se também a outras conclusões, por exemplo em 14 dos atendimentos feitos não foram oferecidos quaisquer meios contraceptivos.
Este estudo tão interessante quanto necessário só peca num aspecto: veio tarde!
" 85 visitas anónimas: planeamento familiar negado aos jovens
Mais de metade dos serviços fecharam as portas aos jovens que procuravam planeamento familiar. Esta é a principal conclusão de um estudo da DECO, cujos resultados vêm publicados na edição de Junho da TESTE SAÚDE.
A associação de consumidores pediu a jovens, entre os 15 e os 20 anos, para procurarem planeamento familiar em 85 estabelecimentos que deveriam fornecer estes serviços: centros de saúde, hospitais e delegações do Instituto Português da Juventude. Em 49, as utentes não passaram da recepção.
Segundo a lei, os centros de saúde e hospitais com serviços de ginecologia devem ter consultas de planeamento familiar e facilitar o acesso aos jovens, seja qual for a sua área de residência. Mas, segundo a TESTE SAÚDE, há um grande abismo entre a teoria e a prática: a maioria dos centros de saúde impediu a entrada às jovens, por não estarem aí inscritas.
Dos 49 serviços que recusaram o atendimento, 27 encaminharam as colaboradoras da associação de consumidores para o centro de saúde da sua área de residência, quando estas já tinham dito que não queriam fazê-lo, por falta de à vontade para tratar o tema com conhecidos. Em 10 casos, fecharam a porta sem dar alternativas. Nos restantes 12, as jovens foram encaminhadas para Centros de Atendimento a Jovens ou delegações do Instituto Português da Juventude.
Quando conseguiram passar da entrada, as jovens foram quase sempre bem atendidas, obtendo a informação necessária sobre os métodos contraceptivos existentes. Das 36 “consultas” analisadas pela DECO, só 4 chumbaram. Nos centros de saúde Arnaldo Sampaio, de Leiria, e dos Olivais, em Lisboa, esqueceram-se de falar do preservativo e da sua importância na prevenção das doenças sexualmente transmissíveis. O Instituto Português da Juventude, de Leiria, e o Centro de Saúde da Alameda, de Lisboa, falharam, sobretudo, as questões sobre a saúde e a actividade sexual das utentes, importantes para recomendar o método mais adequado.
Em 14 visitas, os profissionais não ofereceram métodos contraceptivos, na maioria, porque não os tinham.
O estudo mostra ainda grandes assimetrias regionais. Nas grandes cidades, como Lisboa, Porto e Coimbra, os jovens conseguem aceder com relativa facilidade a informações e contraceptivos. Mas há zonas, segundo a TESTE SAÚDE, como Évora, Viseu e Faro, onde os poucos serviços que existem vedaram a entrada a quem não pertence à sua área, sem dar alternativas. "
Teste Saúde n.º 67 - Junho/Julho de 2007 - páginas 9 a 13